Nomenclatura de Orquídeas Desvendada: Como Classificar Espécies e Híbridos

Entenda as complexidades da nomenclatura de orquídeas, incluindo a identificação de espécies e híbridos. Este guia essencial é perfeito para orquidófilos que desejam dominar as terminologias e aprimorar suas coleções.

Desvendar o mundo das orquídeas é fascinante e recompensador, mas antes de iniciar essa jornada é preciso conhecer algumas regras, sobretudo aquelas relacionadas à nomenclatura das plantas e a definições específicas que identificam espécies, híbridos, clones (ou meristemas) e híbridos naturais.

Certamente, esse não é um assunto simples – até mesmo orquidófilos experientes têm dificuldade e acabam divergindo. No entanto, é prazeroso estudá-lo para evitar erros. Com um pouco de força de vontade e atenção, rapidamente é possível se tornar um “craque” em terminologias.

“Os nomes das orquidáceas são dados em latim ou grego clássico – conhecidos como línguas mortas – para que sejam iguais no mundo todo, sem o predomínio de idiomas vivos (português, inglês, espanhol, japonês, etc). Mesmo novas espécies registradas recebem, pelos taxonomistas, a denominação adequada em latim de acordo com sua linhagem ou de algum detalhe característico”, explica Lúcia Morimoto, orquidófila e produtora de orquídeas da Colibri Orquídeas, de São Lourenço da Serra, SP.

Identificando uma espécie

As espécies são plantas encontradas na natureza que apresentam determinadas características morfológicas e genéticas que permitem sua classificação como pura do ponto de vista botânico, ou seja, são isentas da participação de outras espécies na sua composição genética. 

De acordo com Lúcia, sua denominação leva primeiramente o gênero (Cattleya, Laelia, Oncidium, Vanda, etc), sempre escrito em itálico e com a letra inicial maiúscula, e depois o nome da espécie (purpurata, labiata, anceps, walkeriana, etc), grafado em minúscula e em itálico. “Em Cattleya labiata, por exemplo, Cattleya é o gênero e labiata é a espécie”, simplifica.

O engenheiro agrônomo e orquidófilo da Orchidcastle Agrícola, Roland Brooks Cooke, de Petrópolis, RJ, menciona que, embora menos usual, pode-se usar a nomenclatura sublinhada, ao invés do itálico. “Tecnicamente, deve-se colocar ainda, após a espécie, o nome do botânico que a descreveu – sem formatação específica, apenas com a inicial maiúscula – mas isso é dispensável no cotidiano. Assim, ficaria Cattleya labiata Lindley, já que foi apresentada por Lindley em 1821”, detalha.

Algumas plantas apresentam variações que não são suficientemente distintas para justificar a descrição de uma nova espécie, sendo classificadas como variedades. Alba, semi-alba, coerulea, estriata, rubra, entre outros termos, são usados para designar uma variedade e precisam ser itálicos. “Neste caso, escreve-se Cattleya labiata alba ou Cattleya labiata var. alba, sendo que ‘var.’ é a abreviação de variedade e não é itálico”, afirma Sergio Garcia, orquidófilo brasileiro e diretor executivo da Olompali Orchids, que reside em Novato, cidade da Califórnia, nos Estados Unidos.

Ele adiciona que um equívoco comum é usar o gênero no plural, quando o correto é mantê-lo sempre no singular, mesmo quando há alusão a mais de um exemplar. “O adequado é dizer: ‘Existem várias Laelia purpurata anelata’”, exemplifica.

Quando uma determinada planta, tanto da coleção como na forma nativa, destaca-se pela qualidade e por características muito boas, é lícito que seu possuidor acrescente um codinome “clonal” que a distingue de todas as outras daquela espécie. Esse termo deve ser grafado com inicial maiúscula, sem itálico e entre aspas duplas. “Um exemplo é Laelia purpurata anelata ‘Pinheiro’, que se diferencia das demais Laelia purpurata anelata e, por isso, foi batizada com nome clonal Pinheiro”, ressalta Garcia.

“O nome clonal é de uso meramente horticultural, não sendo válido para fins de classificação botânica”, lembra Cooke, uma vez que ao comparar a Cattleya labiata alba ‘Angerer’ com a Cattleya labiata alba ‘Francisco Garcia’, ambas são botanicamente classificadas da mesma forma por se tratar de plantas do mesmo gênero e de espécie e variedade iguais.

Esses exemplares também são considerados espécies, uma vez que, na sua criação, não houve a combinação de mais de uma espécie. Outro exemplo é a Cattleya walkeriana ‘Dayane Wenzel’, que, de acordo com o orquidófilo de Petrópolis, mesmo que tenha sido produzida pelo homem, por meio de clonagem, e não pela natureza, só possui genes de Cattleya walkeriana e assim é uma espécie e não um híbrido. “Isto se aplica a outras plantas melhoradas, pois foram obtidas por meio da combinação de variedades selecionadas de uma espécie”, esclarece. O diretor executivo da Olompali Orchids observa que ao dividir (meristemar) a planta que possui o nome clonal, suas mudas devem manter a mesma nomenclatura.

Existe ainda mais um caso no qual um cruzamento resulta em espécie: quando há auto fecundação (fecundação com o pólen da mesma planta). Essa combinação é representada da seguinte forma, por exemplo, Cattleya labiata var. semi-alba ‘Marina’ x self.

“Utiliza-se o autocruzamento para tentar produzir exemplares bastante semelhantes à planta-mãe (e não idênticos, como na clonagem), principalmente quando há falta de matrizes da mesma espécie, variedade ou qualidade”, explica o orquidófilo residente nos Estados Unidos, ao acrescentar que essa técnica dá bons resultados, no entanto, “o tiro também pode sair pela culatra”, pois os selfings – termo em inglês para designar a autofecundação – podem deteriorar algumas características, gerando plantas estéreis, com más-formações florais e vegetativas, entre outros.

Lúcia recorda que a prole da cruza com o self deve receber um nome diferente da planta-mãe, pois não será totalmente análoga a ela – efeito que só será alcançado por meio da clonagem.

Cruzamento intraespecífico

É sabido que ao cruzar uma espécie com um exemplar da mesma espécie ou com ela mesma (self), obtêm-se proles da mesma espécie e não híbridos. Mas qual seria a razão para cruzamentos intraespecíficos?

Cooke elucida: “Eles são realizados com o intuito de melhorar, através de seleção, o padrão das plantas das gerações subsequentes, sem perder a condição de serem espécies. Comumente, tornam-se mais caras e são muito mais procuradas pelos aficionados do que os híbridos. Assim, se houver a combinação de uma Cattleya walkeriana selecionada com outra Cattleya walkeriana também de boa qualidade, existe uma grande chance de obter uma planta de qualidade superior àquelas que lhe deram origem, em termos de forma, tamanho, colorido, etc. Ao repetir o processo utilizando mudas oriundas da primeira cruza, amplia-se o percentual de exemplares de qualidade superior e mais aperfeiçoados. A cada geração pode haver um aprimoramento adicional”.

Pelas mãos do homem

O produto do cruzamento de duas ou mais orquídeas de espécies diferentes é sempre um híbrido. “Na combinação Cattleya intermedia com Cattleya luteola, tem-se um híbrido mesmo que ambas matrizes sejam do gênero Cattleya”, afirma Garcia.

Neste caso, a nomenclatura segue outra regra: o gênero continua grafado em itálico e com a primeira letra maiúscula, porém, o nome do híbrido é colocado no lugar da espécie e escrito com inicial maiúscula e sem itálico. “Temos, por exemplo, Cattleya Portia var. coerulea, em que Portia é a denominação do híbrido”, diz a orquidófila da Colibri Orquídeas. Todavia, existem ocorrências em que ele recebe um terceiro nome, como o Cattleya guttata x Cattleya Penny Kuroda, que é conhecido como Cattleya Hawaiian Variable.

De acordo com Cooke, essas denominações não seguem um padrão, elas são escolhidas livremente pelo hibridador, que deve registrar sua criação na Royal Horticultural Society (RHS), na Inglaterra, entidade responsável pela manutenção dos registros do mundo inteiro.

“Depois de notificado um cruzamento no RHS, toda vez que aquela combinação for refeita ou repetida, o nome já existente deve prevalecer. Assim, se alguém combinar uma Cattleya dowiana com uma Cattleya warscewiczii, o resultado é Cattleya Hardyana, registrada por Sander em 1883. E se a Cattleya Hardyana for autofecundada ou cruzada com outra Cattleya Hardyana, o produto continuará sendo Cattleya Hardyana.”

Mas ainda existem os híbridos intergenéricos (que envolvem mais de um gênero), dessa forma, o nome do gênero resultante também precisa ser registrado e quando composto por dois gêneros deve fazer referência às matrizes que o originaram. “Um cruzamento entre Cattleya e Laelia, por exemplo, recebe o gênero Laeliocattleya, o qual por sua vez será grafado em itálico e com inicial maiúscula”, explica Brooks. Caso envolva três ou mais gêneros, o nome pode não se referir a nenhum deles. Um bom exemplo é o Cattlianthe Jewel Box, híbrido resultante da combinação de três orquídeas dos gêneros Cattleya, Guarianthe e Guarisophleya.

Como o número de possíveis cruzamentos é virtualmente infinito, frequentemente novas designações genéricas precisam ser criadas para suprir essa demanda. E o universo dos híbridos não se restringe a orquidáceas do mesmo gênero, e muitas vezes ocorrem combinações de plantas de gêneros que, a princípio, poderiam parecer incompatíveis. É o caso da combinação de Oncidium com Cochlioda, resultando no gênero Colmanara.

O orquidófilo de Petrópolis conta que os híbridos intergenéricos podem receber, ainda, um nome clonal, da mesma forma que acontece com as espécies, no entanto, são plantas com valor meramente ornamental, não sendo de interesse para colecionadores. “Os especialistas têm grande prazer em reproduzir, propagar e aperfeiçoar as espécies puras e raras, contribuindo para a preservação genética”, diz.

Quando o híbrido é desenvolvido por polinização natural (realizada por insetos, vento, etc.), ele é chamado de híbrido natural. Embora não haja a intervenção humana, esse exemplar não é considerado espécie pura porque o cruzamento só ocorreu por existir proximidade genética entre as plantas envolvidas. Nesses casos, a nomenclatura segue o mesmo padrão: gênero em itálico com inicial maiúscula e, no lugar da espécie, o nome que foi atribuído ao híbrido, como em Cattleya x dolosa.

Em sua trajetória como hibridadora e produtora, Lúcia nunca se esquece do dia em que, na sua estufa, se deparou com um vaso de Vanda com inflorescência formada por duas hastes florais. A primeira apresentava flores semelhantes a Vanda coerulea e a segunda com flores que se assemelhavam a Vanda tricolor, híbrido esse que não existia no mercado. “Suspeito que uma abelha tenha polinizado as duas plantas”, relembra.

Os clones ou meristemas são cópias idênticas de uma planta que podem ser obtidos pelo homem através de processos de laboratório. “Nos laboratórios de meristemagem, são coletados e tratados células, pedaços do rizoma, folhas ou hastes de uma planta matriz até formar pequenas mudas, que são idênticas à planta que lhes deu origem, perpetuando assim o patrimônio genético”, observa a orquidófila da Colibri Orquídeas. Em tais exemplares, deve-se manter o nome da matriz que lhes deu origem, por exemplo, Cattleya labiata alba ‘Jeni’, que denomina todas as plantas originadas a partir do exemplar de Cattleya labiata alba ‘Jeni’.

Natural ou criada?

As espécies e híbridos naturais são produtos exclusivos da natureza. É essencial evitar a coleta predatória de plantas nativas em seu habitat, optando sempre por aquelas reproduzidas em laboratório ou em condições controladas. Já os híbridos resultam de cruzamentos realizados pelo homem, visando características desejáveis, como cor, tamanho ou resistência.

O universo das orquídeas é vasto e diversificado, proporcionando descobertas contínuas. Seja qual for a escolha – espécies puras, híbridos naturais ou criados – é essencial respeitar a natureza e valorizar a preservação dessas plantas maravilhosas, contribuindo para a manutenção de sua diversidade genética.

 Texto Renata Putinatti

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